sexta-feira, 17 de fevereiro de 2012

BAIRRO DO MOÍNHO



Foi nesse bairro que se instalou a cepa genealógica do Tenente Urias.

A denominação, segundo Theophilo Souza Carvalho, se deve ao fato de que ali se instalou, juntamente com a mineirada, o primeiro moinho de fubá com pedras de mó trazidas em carro de boi pelo escravo Anacleto, após meses e meses de viagem pelo interior de Minas e São Paulo até chegar em São Miguel Arcanjo. 
Com essas mós vieram também outras que se destinavam à fazenda do sítio dos Pereira, hoje nos municípios de Jacupiranga e Iporanga, fazenda essa pertencente a João Augusto de Souza, primo irmão do Tenente. 
É ainda Theophilo quem deixou impresso no extinto jornal ‘Folha de São Miguel Arcanjo’, edição de 17 de setembro de 1.972, que, em 1.845, lá se colheu grande quantidade de trigo de ótima qualidade que abasteceu toda a população de São Miguel. 
O Tenente recebeu até um prêmio do Governo Provincial, de 5 contos de réis, concedido pelo Imperador do Brasil: a produção foi de 7 mil arrobas de grãos do cereal! 
Na década de 20, era feita do bairro a transladação da imagem de Nossa Senhora da Conceição para a Igreja Matriz, na cidade. 
As novenas aconteciam em intenção da santa, implorando por chuva de que tanto carecia a lavoura no mês de dezembro. 
No ano de dezembro de 1.923, Conceição de Lourdes Piedade foi nomeada para lecionar na Escola Mista Rural do Bairro que fazia parte da 8ª. Região do Ensino. 
Em fevereiro de 1.928, a professora Alzira Kruger foi nomeada para reger a Escola Mista Rural do Bairro do "Moinho Velho", segundo o jornal "Tribuna Popular" de Itapetininga. 
A sala de aula localizava-se na residência de um morador da família Souza Terra. 
Depois vieram as mestras Edna Silveira Mello e Dulce Monteiro. 
Dulce foi esposa de Pedro Borges; com o falecimento deste, casou-se com Abdala Jabur. 
Mais tarde, ainda os professores João Reichert, Anna Faustina R. Brisola, Luiza Como, Anna Vieira e Francisca Maria Augusta se revezaram na alfabetização de algumas dúzias de crianças. 
Voltando um átimo no tempo, com a morte do Tenente Urias e a consequente libertação dos escravos, uma das suas propriedades denominada Fazenda do Moinho passou a ser reduto dos negros, claro que com a permissão dos herdeiros. Ali foram levando a vida criando porcos, galinhas, vacas, cabritos, fazendo farinha no moinho deixado pela família que era tocado a água. Faziam biju, doce de leite e vendiam lenha que era transportada em carro de boi. 
Três ex-escravas, Fermina, Maria Grande e Benvinda moravam também no bairro. Benvinda fazia pão na padaria do Ernesto Cauchioli na praça da Matriz, onde hoje está a Casa Lotérica. Nessa época, ela alugava um cômodo na casa do Major João Paulino da Silva. 
As três se juntaram para prestar homenagens a Nossa Senhora das Neves, protetora dos escravos.Tiravam prendas, faziam bailes, leilão de gado, dançavam fandango com bandas de pé, rezavam rosário durante todo primeiro sábado do mês de agosto. 
A festa se tornou tradição no lugar e a outrora Fazenda do Moinho transformou-se em Bairro, o Bairro do Moinho. 
De lá os Ciprianos, ascendentes de José Cipriano Filho com quem Tereza, filha de Escolástica Vieira da Silva se casou em 1.957, ela que continuou as festividades a Nossa Senhora das Neves, com o desaparecimento das ex-escravas. 
Uma delícia saborear os doces, as broas de milho, os suspiros e os biscoitos que Escolástica e sua filha Tereza faziam nessas festas! 
Na década de 40, o Moínho era completamente tomado por fornos de carvão. 
Um documento datado de 1.949, porém sem assinaturas, fala de um local denominado Sítio do Pinhal Grande; este documento foi guardado pela família de Mário Augusto de Medeiros e a nós cedido pelo seu neto Paulo Manoel da Silva Filho:



























Lá possuiram fornos: José Arantes Galvão, João B. Brisola, José de Paula, Belarmino e José Vieira Machado, Licino Pinto, Leonildo de Deus, Abílio Vieira, Benedito Garcia, Isaltino de Matos, Agenor Neto, João e Salvador Rosa, Rufino Neto, Brasílio Francisco, Pedro Neto, Quintino Bueno, Antonio Vieira Machado, Lauzírio de Almeida, Camilo Neto, Paulo Teobaldo, José Pereira, João José da Silva, Laurindo S. de Almeida, Alfredo Isaias, Tamírio Cirino, João A. Nunes,Camilo N. Ribeiro, Pedro Marques de Almeida, José Pereira da Silva, João Antonio da Cruz, Gregório Vieira Machado, Delfino Pereira da Silva, Abílio Roque, Miguel Pereira da Silva, Damiro Bueno e João Vieira Machado. 
Sucedeu ao Tenente, bem mais tarde, o Comendador Dante Carraro que ali se instalou plantando trigo. Parte de suas terras hoje pertencem à Empresa de Eletricidade Sul Paulista. 
Com a morte de Dante Carraro, todo o maquinário da Fazenda Atlântida foi entregue ao Governo e ela foi dividida em lotes, segundo informações contidas no Livro Tombo da Paróquia de São Miguel. A viúva de Dante, Inês Ferralino Carraro, acabou vendendo as ações ao Conde Raul Crespi, proprietário da Cia. Itauba e também ao Marquês Pietro Pottino, de Palermo. 
Com esse desfecho, mais de 40 famílias tiveram que deixar a Fazenda. 
Na década de 60, lá pagavam impostos por possuirem carvoarias a Fazenda de Trigo Atlântida S/A e Licério de Oliveira Pinto. 

UM CAUSO DA TERRA
"Salvador Cará" 

Salvador Cará não tinha mais nenhum parente pelas bandas do Bairro do Moínho onde nascera e ainda morava. 
Gostava de um truco e até arranhava umas cordas de viola nos bate-papos com os companheiros. 
Toda manhã, depois de fazer a garapa de cana para o café, enfiava o virado nas costas e ia para a roça do "Seu" Souza. 
Munido de enxada e enxadão, preparava o terreno para plantar feijão, milho e arroz. 
Sempre pela mesma trilha. 
De manhã e à noitinha. 
Numa certa altura do caminho, existia lá um toco, um resto de árvore que ficou na terra depois da derrubada. 
Um cerne. 
Com as chuvas, o toco foi ficando cada vez mais visível. 
E o Salvador Cará foi tropeçando nele todo dia. 
- "Toco marvado!" - exclamava. 
E o toco parecia até bambear de vez em quando, tanto tranco que levava do Cará. 
Era cedo, era de tarde. 
- "Toco marvado!". 
E o dedão do pé direito do Cará já com a unha preta, querendo cair. 
Mas que coisa! 
Ele nem se lembrava que levava nas costas enxada e enxadão. 
Todo santo dia. 
Uma tarde, porém, o tropeção foi tão forte que o dedão lhe saltou do pé. 
Assustado, Salvador Cará olhou para ele, já nessas alturas a uns dez metros de distância, tão forte fora a batida. 
Fitando o dedão no chão ensanguentado, sujo de terra e sementes de catingueiro, em voz alta ele bradou: 
- "Agora, danado de dedo, seu desgraçado, nunca mais você tropica!". 
Amarrou o pé com um pedaço de manga de camisa e voltou para o rancho. 
Quase morreu de infecção. 
O que lhe salvou foi lavar o toco do dedão com picão e carrapicho. 
Era o tempo do Jeca Tatu, aquele que fazia propaganda do Biotônico Fontoura. 
Era o tempo da luta contra a esquistossomose. 
Em São Miguel Arcanjo, quem diria, também havia um Jeca Tatu. 
Era o Salvador Cará. 


Um comentário:

  1. Olá Luiza! O major João Paulino da Silva é o pai do Amaro Paulino da Silva? Sou bisneta do Amaro

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