domingo, 26 de fevereiro de 2012

1.920: A ORQUESTRA DE ÂNGELO MAZZALAI.


Ângelo Mazzalai era regente do coral da igreja católica e da banda de música local, que se tornou uma orquestra com o nome de Jazz Band Espalhafato.
Esse maestro casou-se em 1.915 com Maria Emília Fogaça, filha de Manuel Fogaça de Almeida e Francisca Leonel Ferreira Leme Brisola, ambos de Itapetininga, que era viuva de Cesário Leonel Ferreira, de Itapetininga.
Natural de Trento, na Itália, é o primeiro à esquerda, na foto. 
Outros: Antonio Ferreira Leme (terceiro, em pé, partindo da esquerda); Cassiano Vieira (o quinto, logo a seguir); Alceu Nogueira, pai do sapateiro "Nico"( ocupando a cadeira número dois, a partir da esquerda). 

A IGREJA QUE NÃO É MAIS DE FRANCISCO RIBEIRO.





SÃO MIGUEL E O POVO RELIGIOSO QUE O HABITAVA.





Promessas comuns de antigamente: bilhetinho encontrado nos guardados de Aparício de Oliveira Terra.


Povo fervorosamente católico. 




Quando o piso da Igreja Matriz de São Miguel Arcanjo ainda era de tijolos. 
O altar construído com tanto carinho ao tempo do Padre Francisco Ribeiro.

As fotos são do nosso arquivo.

ANTONIO JOSÉ DE LIMA, UM "BAITA" HOMEM!



Antonio José de Lima, também conhecido como Antonio Fonseca, era proprietário de um sítio bastante extenso no Bairro Turvo dos Pedrosos, bem na divisa de São Miguel Arcanjo com o município de Capão Bonito.
Tropeiro e rico agricultor, casou-se com dona Rufina, com quem teve vários filhos, entre eles Jorge, Pedro, Dolores, Cecília, Benedita, Ortília, Xanda.
Para situá-lo mais próximo de nós, lembramos que a filha Cecília era esposa do Durvalino Brizola e avó de Pedro Paulo Fonseca; a outra filha Benedita era avó das professoras Cleide e Inês; uma outra, a Ortília, foi quem emprestava uma sala em sua residência para que funcionasse a primeira escola do Bairro Turvo dos Pedrosos.
Já a filha Xanda, saudosa e querida, era mãe de Igino Medeiros, ex-bancário, ora aposentado, que possui uma barbearia na Rua Monsenhor Henrique Volta, em São Miguel Arcanjo.
Conhecemos também um neto de Antonio Fonseca, o Mané Trindade, quando estava no auge dos seus 80 anos de idade.
Mas era a afilhada de Antonio Fonseca, Aparecida Maria Ferreira, esposa de Laurentino Ferreira, neto do Antonio, quem gostava de contar sobre o padrinho. 
As lembranças lhe chegavam fortes na memória de 78 anos de idade, quando se pegava a recordar do cavalo que ele possuia. Eternamente encilhado, era alugado para transportar as noivas até à capela da cidade.
- Encilhado - ela explicava - porque apertado com cilha, que era uma tira de pano ou de couro que passava por baixo da barriga nas cavalgaduras. A noiva vinha sempre à frente do resto da cavalaria. Vinha com um chapéu bem grandão, e o vestido branco cobria todo o animal. Era uma coisa tão linda da gente ver... Um espetáculo! 
Na foto acima, de nosso acervo, Antonio Fonseca ao lado das filhas Cecília, a mais nova, e Dolores, ambas com descendências em Capão Bonito, onde sempre residiram.
Detalhe: o cinturão usado por ele, geralmente feito de couro ou de camurça, a que denominavam de guaiaca, e as polainas que protegiam a parte inferior das pernas e eram usadas por cima do calçado.

Ano da foto: 1.920.



PROPAGANDA POLÍTICA DE NESTOR FOGAÇA- 1.947.




sábado, 25 de fevereiro de 2012

ROQUE MARIANO RIBEIRO



E ROQUE MARIANO RIBEIRO, QUEM FOI?

Roque nasceu em agosto de 1.932 na cidade de Porangaba. 

Era filho de Francisco Mariano Leite, conhecido como Chico Pipoqueiro. Com 18 anos, veio residir em São Miguel, com a família. Aqui, casou-se com Conceição Pereira e tiveram um casal de filhos: Fábio Antonio e Mariângela. 
Durante os primeiros anos foi trabalhar no extinto Hotel Ipiranga, sito na Praça Antonio Ferreira Leme, na época, magnífico cartão postal de São Miguel Arcanjo. 
Foi Gerente da Loja de Munira Abrão, viúva de Fuad Abrão, Gerente responsável pelo Cine Teatro São Miguel, Diretor da Bomboniere que funcionava no mesmo, Redator - Chefe do jornal “Folha de São Miguel Arcanjo” (do itapetiningano Ivo Cerqueira), além de Representante do jornal “O Estado de São Paulo”, Correspondente da “Folha da Baixada” e responsável pela divulgação comercial falada na cidade. Também possuiu uma oficina de máquina de costura e um atelier de pintura comercial. Tudo se englobava na Organização RoMaRi, inaugurada em 15 de junho de 1.971. 
Tomou parte da Comissão Municipal do Movimento Brasileiro de Alfabetização de São Miguel como chefe da subcomissão de propaganda e motivação, ao tempo de José Pereira, Miguel Terra Domenici, Sadamitsu Iwassaki, Maria Aparecida Silva Fogaça, Mário Monteiro de Carvalho, Alfeu Antonio Vieira, Valdil Correa de Souza, Pedro Mariano Machado Júnior, Antonio Marmo Fogaça de Almeida, Vital do Espírito Santo, Maria do Carmo de Almeida e Durval Rodrigues. 
Juntamente com Pedro Mariano Machado Júnior e Ari Leme Pinheiro, no dia 1º. de julho de 1.971, fundou a Argus S/C Ltda., que tinha como objetivo trabalhar no ramo de representações e promoções. Residiu na Rua Manoel Fogaça, 665 e seu endereço comercial ficava na Rua Siqueira Campos, 770 A e 779 A, onde permanecia das 8 às 24 horas. 
Em todas as suas atividades sempre quis demonstrar o grande amor pela cidade. 
Foi ele quem inventou a expressão “Capital da Uva Itália” para São Miguel Arcanjo, e que até hoje carregamos. 

AMOR À CIDADE 


Em 02 de agosto de 1.970, no jornal “Folha de São Miguel Arcanjo” ele publicou uma linda crônica sobre a cidade intitulada “Em Ritmo de Trova”. 
A crônica é a seguinte: 

“Na manhã amena de São Miguel Arcanjo, neste inverno macio de frio saudável, o passeio é agradável, bom é andar. 
Os ônibus verdes, lustrosos que passam, que chegam, que vão, dão um quê de notável, de rica, de amável à cidade pequena que acorda tão cedo. 
Não vejo a preguiça, não vejo o bocejo das pequenas cidades que dormem ao sol. 
Há aqui um encanto dos homens, do Santo, não sei do que seja, mas noto que a ordem é aqui trabalhar. 
Bendito este povo, cada dia de novo bem cedo na luta, bem certo, confiante que o progresso virá. 
Na Praça, que a ordem, bom dia, Prefeito, esta praça é singela e mesmo assim está bela e se meios houvesse na certa é que ela mais bela seria. 
Eu vim lá de longe, Prefeito, notei pelas ruas mais ordem, no entanto, notei os terrenos baldios, com cerca ou sem muro, sem nada, que feio, um meio haverá certamente que obrigue essa gente que os tem a depressa fechar. 
Não digam que é duro fazer um bom muro, que pior é ficar o quintal em aberto ou com cerca caída e decerto, que vida, perder o terreno, se a lei obrigar. 
Obrigue, Prefeito, obrigue essa gente, ora essa, depressa o terreno fechar. A fechar e limpar, que havendo limpeza, beleza haverá. 
E se for caso da Câmara, é só oficiar, pedir, demonstrar que vai ela por certo bem logo aprovar um imposto tremendo de fazer essa gente correndo fechar com bom muro, que pagar é mais duro e bem pode acabar em perder o terreno. 
Está certo, Prefeito? 
Na Praça em que estou, da Matriz em que entrei, o relógio bonito bate agora mais horas. 
Relógio do João Thomaz. Relógio que a sorte deu, que sorte um relógio assim. 
Que sorte, Padre Francisco, um relógio tão certo para uma igreja tão linda de um vigário tão bom. 
Bendita a cidade que tem de tudo isso! 
E agora passei, já vi ruas, vi casas, vi ônibus, carros e gente que vem, e gente que vai, todo mundo trabalha e eu a passear. 
Por certo preciso, está ali o Paulico, ir-me barbear. 
E enquanto o artista, que cedo começa, perfaz seu trabalho, eu me ponho a esperar. 
E escuto opinião de quem seja não sei, mas errada eu achei, de que nesta cidade não é bom construir. 
Ora essa, que coisa, aonde, quem aqui veio, aqui mora, reside ou nasceu, se criou e viveu, vai botar seu dinheiro que aqui já ganhou? 
Como pode, acode a quem lê tal idéia, de que nesta cidade não é bom empregar? 
Se ela é hoje menor, maior ficará. 
Se ela é hoje tão boa, melhor há de ser. 
E por que essa ideinha pequena de ver nas cidades pequenas somente o que tenham ainda de menos? 
Louvados aqueles que às cidades pequenas, bonitas, amenas como esta, estimam e lhes tiram o menos e dão-lhes o mais, e se nelas nasceram, nelas cresceram, ganharam, viveram, morrem por elas, que a vida é uma só e a saudade castiga quem longe do berço põe a viver”. 

Pela portaria municipal de no. 42, de 18 de agosto de 1.970, Roque Mariano compôs a Comissão para programar os festejos da Semana da Pátria na cidade, ao lado de José de Souza Barros Filho, Mário Monteiro de Carvalho, Adelina Prandini Ribas, Cassiano Vieira, Toamitse Iwassaki, Ivan de Góes, Pedro Makyiama e Antonio Raskevicius. 

Pela portaria no. 34, de 13 de julho de 1.971, Roque Mariano participou de um Grupo de Trabalho constituído pelo Prefeito Alcidino França com a incumbência de investigar sobre o esvaziamento demográfico e econômico do Município, propondo em amplo relatório quais eram as causas que o provocavam e apontar sugestões para a solução do problema. 

Outros cidadãos: Sadamitsu Iwassaki, Presidente do Sindicato Rural; Iroshi Takesusuke, Gerente da Cooperativa Agrícola de Cotia; Cônego Francisco Ribeiro; Miguel Terra Domenici, Vereador; Aparício de Oliveira Terra, Gerente da Caixa Econômica do Estado de São Paulo; Joaquim Ignácio Rodrigues Júnior, Tabelião e Narlir Miguel, Comerciante. 

Em 1.972, integrou a chapa 2 da Arena local, ao lado de Cassiano Vieira, Alcidino França, Francisco Tavares de Pontes, Geraldo Piedade, Miguel Terra Domenici, José Dias da Silva, Anízio Domingues, Aparício Oliveira Terra, Massami Aoyaguy, Miguel Isaac Daniel, Emílio Gabriel, Antonio Rosa do Nascimento, José Carlos Carvalho Volta, José Moysés, Guerino Antonio Mossin, Miguel Dias da Silva, José França, Antonio França, José Ramos e Aristeu Válio. 

O REDATOR 

Para Roque Mariano Ribeiro, a missão de propagar São Miguel Arcanjo por todos os quadrantes do território nacional era nobre e ele faria isso sob pena de qualquer sacrifício. 
Para ele, a política e o jornalismo eram, indiscutivelmente, os caminhos mais atravancados dos empecilhos inerentes aos nobres empreendimentos humanos. 
Afirmava que “os autênticos políticos, os que verdadeiramente desejam a felicidade de suas Pátrias são verdadeiros apóstolos e lutam com toda sorte de obstáculos para alcançar seus nobres objetivos”. 
Já o jornalista, principalmente aquele do interior, “é o bode expiatório de todas as culpas se deixar os elogios e passar a criticar, mesmo no mais alto padrão construtivo”. 
O jornalista sério luta para manter sua independência financeira e poder “conscientizar a sociedade, longe do partidarismo e das tendências individuais”. O mau jornalista, esse “se enrosca aos folhetins, manifestos e outras badalações só para estampar a vaidade social da localidade”. 

O APELO 

Na edição de 18 de março de 1.972, na primeira página: 
“A “Folha de São Miguel Arcanjo” também tem seus detratores e criticastros, empenhados numa propaganda negativa. São forjadores e deturpadores dos assuntos normais, interpretadores gratuitos daquilo que está claro, pelo simples prazer de destruir. E dos que temos conhecimento não são assinantes, são leitores avulsos. Eles gostam do nosso trabalho. Leem e analisam. Criticam e propagam. Não estamos contra eles. Queremos apenas esclarecer que não temos a pretensão de sermos perfeitos, confessamos que temos nossas falhas, mas queremos, dentro do espírito de colaboração, dar ao município um órgão de imprensa sério, honesto e independente. É da cooperação mútua que se forjam as grandes coisas. É unidos que daremos a nossa terra tudo aquilo que ela necessita para nos proporcionar o que almejamos. Por esse motivo, livrem-nos de sermos bodes expiatórios. Antes de criticar o jornal e o jornalista, ajudem-nos a melhorarmos, colaborem conosco enviando até mesmo suas críticas e reclamações que acolheremos com satisfação e as faremos públicas. Mas, por amor à obra que é do município inteiro, sabedores de que não somos contra ninguém e sempre nos dispusemos a servir a todos, assinem este jornal”. 

O CARGO PRETERIDO 

O pleito de 15 de novembro de 1.972, que transcorreu em clima de paz e tranquilidade, deu vitória a José França, candidato da ARENA 2, com um total de 2.533 votos contra 772 de Luiz Válio Júnior, do MDB. 
Votaram 3.692 eleitores. 
Anularam o voto 234 eleitores e 153 votaram em branco. 
O MDB elegeu apenas Daniel José da Silva com 118 votos. Como ele afirmava e até se gabava disso: - “Me elegi só com os votos das prostitutas da cidade”. 
Já a ARENA conseguiu eleger 8 candidatos. Entre eles, Roque Mariano Ribeiro, com 144 votos. Os outros eleitos: Luiz Gonzaga Albach (598 votos), Orlando Rosa (565 votos), José Dias da Silva (329 votos), Policarpo Torrel Neto (213 votos), Amador Nunes (206 votos), Nelson Rodrigues (174 votos) e Oscar Arrivabene (172 votos). 
O suplente com maior número de votos foi José Baptista, com 136 votos. 
O que fez Roque Mariano Ribeiro? 
Com elevada dose de justiça, decidiu abdicar em favor de José Batista, com a seguinte declaração: 
- “Em consideração à expressiva votação de José Baptista que é conhecido como Zé Eleutério e os eleitores sufragaram nas urnas esse nome em vez do nome certo, vou desistir da minha cadeira em favor dele que seria o quinto colocado dentre os mais votados do pleito. Se minha votação conseguiu me eleger na “lanterninha”, é prova de que menor número de eleitores me prestigiou, enquanto a maioria escolheu José Baptista, colocando na cédula José Eleutério”. 
“É preciso respeitar essa maioria em consideração à vontade individual”. 
“Peço desculpas aos meus eleitores, mas tenho a certeza absoluta de que estou agindo com justiça e acerto nesta minha desistência, uma vez que me fugiu da memória requerer ao Juiz Eleitoral o reconhecimento da alcunha do meu companheiro de chapa no momento oportuno”. 
“Obrigado sincero quero transmitir ao meu eleitorado, e, a Zé Eleutério, o José Baptista, os meus parabéns”. 
No entanto, ele acabou cedendo aos seus eleitores. 
Parafraseando D. Pedro no Dia do Fico, ele disse: 
- “Se é a vontade daqueles que confiaram em mim, eu fico. E irei revolucionar os alicerces da política local para o bem estar de todos, naturalmente, ao lado dos meus companheiros de luta”. 
Uma de suas primeiras reivindicações foi que se instalasse em São Miguel uma Escola Normal e, para isso, junto com o Prefeito eleito, José França e outro colega vereador Nelson Rodrigues, viajaram a São Paulo já no mês de dezembro. 
Foi eleito Secretário da Presidência da Câmara e ainda tomou parte da Comissão de Justiça, Redação e Cultura, ao lado de Policarpo Torrel Neto, Orlando Rosa e José Dias da Silva. 

POR QUE A POLÍTICA? 

Ele mesmo dizia que, como redator do único jornal da cidade tomara conhecimento, por mais de dois anos, das aspirações e necessidades do povo. Desde que a “Folha de São Miguel Arcanjo” foi fundada em 14 de junho de 1.970, a população escrevia para o jornal, reclamando dos serviços públicos, reivindicando melhorias, pedindo seu auxílio para que as autoridades ouvissem a sua voz. Tanto moradores da zona urbana como da rural pediam melhorias para estradas, escolas, atendimento médico-sanitário, auxílio ao pequeno lavrador, pavimentação, asfalto, instalação de um camping oficial no Bairro do Turvinho, criação de um Centro Comunitário de recreação e cultura, etc. E ele resolveu brigar por tudo isso. 
No início de 1.973, deixou a gerência do Cine Teatro São Miguel e da oficina de máquinas de costura, para entregar-se, além da política, à vida jornalística. 
Como era agente de assinaturas e correspondente dos grandes jornais, acreditava-se apto a divulgar o município e reivindicar o que ela mais necessitava pelo bem do povo. Essas assinaturas dos jornais lhe possibilitavam favorecimento monetário compensador. 

UMA LOROTA 

No ano de 1.973, Roque Mariano dizia que fora aprovado em um suposto concurso e mandou publicar que levantaria voo em breve da cidade para a Amazônia Integrada. Que havia obtido a segunda classificação e o cargo de Subgerente de uma grande firma norte americana no ramo de exportação e importação com sede em Manaus. 
O contrato seria por dez anos e dez salários regionais de subsídio, mas ele teria que começar a trabalhar em janeiro de 1.974, pois a firma faria sua inauguração em solo brasileiro no mês de março desse ano. 
Junto com o contrato viria casa mobiliada, pagamento de contas de luz, água e telefone e a aposentadoria depois de apenas nove anos. 
Para a mudança, Roque não poderia portar bagagem com peso acima de duzentos quilos. 
Conforme conversa com sua esposa Conceição no mês de setembro de 2.010, ela nos disse que fora tudo invenção dele. 

FIM DA FOLHA 

No dia 30 de novembro de 1.973, editava-se o último número do jornal “Folha de São Miguel Arcanjo”. 
Manchete: “Este jornal será o último: a renda não dá para a despesa”. 
Os argumentos da Diretoria? 
- “Como só a união faz a força, nossa força está bloqueada pela desunião do interesse. Por isso nós paramos por aqui, deixando expresso e impresso nosso agradecimento às pessoas que colaboram com este semanário. Pára, mas não morre. Fica na saudade daqueles que mereceram um elogio nestas páginas e no desgosto daqueles que receberam uma reprimenda. Mas não fomos nós que forjamos a notícia. Nós apenas a tornamos pública”. 
“Este jornal intemerato circulou em vinte e cinco cidades paulistas e mais outras tantas dos demais Estados brasileiros, e chegou com a imagem deste povo em todos os Departamentos federais e estaduais. Humilde, sim, mas chegou. Foi lido; as cartas e telegramas publicados em suas próprias páginas vindos das mais diferentes autoridades comprovam que este modesto semanário era lido; que suas reivindicações eram percebidas e que muitas delas chegaram a ser realizadas”. 
“Queremos agradecer penhoradamente à Prefeitura, à Câmara, às autoridades que sempre colaboram com este jornal; não estão inclusos entre os responsáveis pela paralisação deste semanário. Mas como uma andorinha só não faz verão, o que podemos fazer? Fechar as portas com mágoas no coração e lágrimas nos olhos”. 
“Obrigado aos que sempre colaboraram, obrigado aos que colaboraram um pouco, obrigado aos que nos incentivaram. Mas infelizmente essas pessoas representam a minoria”. 
“E este jornal chega ao fim neste número. São 173 exemplares na coleção de sua edição; são 173 medalhas que coroam os esforços da equipe que forjou este semanário e das pessoas que com ele colaboraram. A lacuna que virá posteriormente dirá aos que não colaboraram a verdadeira razão da paralisação da “Folha de São Miguel Arcanjo”. 
“É possível que um dia ele volte. Assim como é possível que um dia um outro venha, como os outros que vieram e se foram, mas, então verá que manipular um jornal que agrade gregos e troianos será impossível, porque um jornal local que procure tão somente agradar também cai no vazio, porque os leitores também se cansam de ler só elogios. Porque o leitor quer informações do certo e do errado. Porque para noticiar somente as boas imagens do local e defender a nossa gente, foram e serão publicados em tantos outros jornais de fora que aqui circulam”. 
Roque Mariano jamais deixou de ser agente de jornais como O Estado de São Paulo, Cruzeiro do Sul, Jornal da Baixada. Tudo o que aqui era notícia, lá estava Roque Mariano mandando publicar. 
Hoje, seu filho continua sendo agenciador em São Miguel Arcanjo. 
Roque Mariano Ribeiro faleceu no dia 26 de novembro de 1.991, em consequência de um enfisema pulmonar. 
Através da Lei 1.793, de 16 de setembro de 1.992, teve seu nome inserido em uma das ruas do Conjunto Nova Bela Vista, em São Miguel Arcanjo. 


SÃO MIGUEL ARCANJO 
UMA HISTÓRIA 
UMA ESPERANÇA 

Os textos abaixo foram escritos pelo saudoso Roque Mariano Ribeiro. 
Segundo ele, consultando o livro da família mineira, de autoria do Dr. Ricardo G. Dalton, esposo de D. Iria, que era neta do Tenente Urias Emídio de Souza Nogueira, e também recebendo a colaboração voluntária de outro sãomiguelense saudoso, Domingos Nogueira de Medeiros, o “seu Tico”. 
No ano de 1.971, essas pesquisas foram publicadas em forma de capítulos pelo periódico “Folha de São Miguel Arcanjo”, propriedade do também saudoso Ivo Cerqueira, e no qual Roque Mariano atuava como chefe de redação. 
O jornal desapareceu. 
Poucas pessoas possuem alguns dos seus exemplares. 
O livro de Dalton foi desmistificado em diversos pontos pelo engenheiro civil e ex-diretor da Associação Brasileira de Pesquisadores de História e Genealogia, Manoel Valente Barbas, nascido no ano de 1.930, tetraneto do Tenente Urias Emygdio Nogueira de Barros. 
Autor do livro intitulado “Da Fazenda Velha a São Miguel Arcanjo - a Saga do Tenente Urias”, o famoso “livrinho verde”, lançado no ano de 1.998, em São Miguel Arcanjo, com prefácio do então Prefeito Luiz G. Albach, Barbas ainda vive e continua na ativa, ocupando o cargo de 2º. Vice-Presidente da Associação acima referida que ele ajudou a fundar. 
O que permaneceu de tudo isso? 
Permaneceu o grande amor que os cidadãos Domingos Nogueira de Medeiros e Roque Mariano Ribeiro, quando vivos, devotaram a São Miguel Arcanjo. Mesmo porque, hoje em dia, ninguém perde seu tempo em pesquisas, se não for por amor. 
E é esse amor que queremos, neste singelo trabalho, resgatar. 

VAMOS ÀS ESTÓRIAS 

MINAS GERAIS 

Sãomiguelense, a nossa história começa lá em Minas Gerais. Precisamente nas cidades de Baependi e Aiuruoca, onde viviam as famílias Nogueira, Machado, Souza, Terra, Galvão, Arantes, Noronha e outros ramos entrelaçados às mencionadas. 

Em Casa Branca, cidade paulista junto à divisa de Minas Gerais, também viviam membros dessa família. 

De um incidente de mau gosto surgiu o primeiro passo que redundou longe esta cidade. 

Em Baependi vivia o Tenente Urias Emidio de Souza Nogueira, na época que o situamos, viúvo de dona Ana Constância Alves da Cunha. 

Fazendeiro bem situado era o Tenente Urias senhor de muitos escravos e por esse motivo mal visto pelos ardorosos abolicionistas. 

Embora longe estivesse a Lei Áurea, era livre o filho da escrava nascido depois da Lei do Ventre Livre (do Visconde do Rio Branco- 1.871) e não foi difícil enredar o moço viúvo com uma garota de menoridade, cuja mãe escrava ainda vivia sob domínio dos feitores do fazendeiro. 

Acenderam o pavio da discórdia. 

Os abolicionistas compraram a briga. 

A menor, guardando no íntimo ferrenha aversão pela situação materna, prestou-se bem à trama urdida, forçando ao fazendeiro algumas medidas preventivas que pouco efeito surtiriam. 



PROBLEMAS 

Os problemas do Tenente Urias Emídio de Souza Nogueira iam se avolumando em Baependi e Aiuruoca, justo porque a animosidade bairrística movia a família toda quando um membro fosse atingido por qualquer desentendimento. 

E a família do Tenente era grande ligada a muitas outras através de casamentos. 

Resolveram deixar Minas Gerais e tentar a sorte com o café no Vale do Paraíba. Nesse ínterim, um tiro no escuro vitimou o esposo de dona Maria Bárbara de Jesus. Morto Emerenciano Alves da Cunha, ou João Emerenciano Machado, os inimigos do Tenente tentaram incriminá-lo. Seria o melhor modo de vingarem aos escravos que desejavam libertar. 

Esse outro incidente veio apressar a partida. 

Avisaram por um estafeta aos familiares de Casa Branca, convidando a participarem da caravana. 

E foi aí que o Tenente veio saber que o Governo Imperial pretendia abrir uma estrada para o litoral sul, partindo da Vila de Nossa Senhora dos Prazeres de Itapetininga, da Comarca de Itu, até Iguape, passando por Santo Antonio do Juquiá, arraial alcançado no planejamento de uma Estrada de Ferro. 

Para quem abrisse o picadão de rumo cortando a serra Paranapiacaba, havia a proposta de um contrato de dez contos de réis. 



NOVO RUMO, VIDA NOVA 

Gente de Baependi e Aiuruoca formou a caravana. 

Passo a passo, Minas Gerais ia ficando. 

A tropa morosa avançava para a divisa de São Paulo. Homens, mulheres e crianças sorriam como se pressentissem a proximidade da Terra Prometida. Rumavam para os cafezais do Paraíba com um alforje cheio de esperanças. Deixavam para trás as intrigas, os invejosos, os traidores. 

Marchavam por um novo rumo para uma vida nova. 

Casa Branca surgiu como primeiro contato civilizado depois de muitos dias. E ali o Tenente Urias tinha parente cuja influência na Corte e na sede da Província de São Paulo veio alterar os planos de princípio. 

Havia interesse do Governo brasileiro em abrir uma estrada. Havia interesse de vulto na aventura bandeirantesca do Tenente Urias. Por outro lado as terras virgens e o sertão bravio da Paranapiacaba afiguraram na mente do mineiro um rico torrão aurífero. 

E os planos foram alterados. 

A marcha paralisou em Casa Branca donde o Tenente Urias manteve contato com representantes do Governo Imperial. 

As negociações demoraram quase cinco meses que os homens sitiaram em Casa Branca. 

Afinal o contrato. O Governo Imperial era o contratante. Abaixo do selo régio, a assinatura do Tenente Urias. 

Dez contos de réis o preço do traçado e picadão que cortaria a Serra do Mar. 

O rumo partia da Vila de Nossa Senhora dos Prazeres de Itapetininga para Santo Antonio do Juquiá, onde bifurcava rumo aos portos de Iguape e Cananéia. 

Outra vez caminhar... Não mais ao Paraíba. 


A TERRA E O HOMEM 


Muitos dias de caminhar. A rota desconhecida provocava estranha fobia nos viajores. 

As pousadas nos ranchos de tropeiros não tinham o conforto dos catres bem forrados. Tudo cheirava a suor das bestas nos lígares e nos pelegos. 

Passo a passo, pouso por pouso, na mente o mesmo sonho: avistar além de cada monte a Terra Prometida. E essa Terra se distanciava depois de cada curva. Mas já estava casada com o homem, porque existia na mente como algo sugestivo e sedutor. 

Uma vida ficava para trás, cheia de uma saudade agri-doce. 

Renascia o homem para uma vida nova em terra nova. 

Esse homem era o Tenente Urias, senhor de muitos escravos. Era o líder de muitas famílias que nele confiaram para a aventura bandeirantesca. 

Esse homem trazia uma predestinação histórica: plantar uma cidade às bordas da Paranapiacaba. 

Há males que vem para o bem. 

E o passo do homem trouxe a cidade... São Miguel Arcanjo. 

Uma história nasceu da esperança de um homem. 

A imortalidade veio com ele de Baependi. Veio com os seus de Aiuruoca e Casa Branca, chegando primeiro à Freguesia de Nossa Senhora dos Prazeres de Itapetininga. 

TERRA NOVA 


Na Freguesia de Nossa Senhora dos Prazeres de Itapetininga, a caravana parou. 

Era a última etapa da longa viagem. Seria preciso somente alguns contatos com as autoridades da Comarca de Itu, depois, a fixação em terras próprias do acampamento para abertura do picadão da nova estrada. 

Às bordas da Paranapiacaba havia uma fazenda. Pertencia ao velho Coronel José Nogueira, mais conhecido por Coronel Nogueirinha. Chamavam-na “Fazenda Velha”, justo porque seus proprietários arribaram anos antes em busca do Morro do Ouro de Apiaí, regressando sem conhecer sequer a direção da mina lendária. 

A Fazenda renasceu do abandono. 

O Tenente Urias entrou em contato com o velho Coronel e a caravana marchou com direção à “Fazenda Velha”, ponto inicial do traçado da estrada litorânea. 

Havia sorrisos de esperança nos lábios dos viajores que pisaram pela primeira vez a velha estrada do Rincão. 

As rodas dos carros sulcavam o areal marcado pelas cavalgaduras, deixando longo o rastro do passado. 

Pela frente descortinava o futuro apoiado num contrato de dez contos de réis. 

Era o ano de 1.871. 


EM TERRAS DA “FAZENDA VELHA” 

O Coronel Nogueirinha recebeu aos recém chegados de braços abertos e mandou vir da Comarca de Itu alguns barris de vinho velho e aguardente de Parati. 

Embora empobrecido, relativamente, pela falta de estradas e pelo reflexo negativo da aventura mal sucedida em busca do Morro do Ouro, o velho Coronel da Guarda Nacional mantinha a tradição da boa mesa. 

A chegada dos mineiros representava à região um passo gigante nas vias do progresso. 

Como consequência da abertura da estrada para o litoral, haveria a conservação permanente das demais que ligavam à Capital, proporcionando a retirada de mercadorias que se perdiam nas entressafras por não ter comprador. 

Aquela época apresentava um paradoxo: “a pobre fartura”. 

Se por um lado sobrava mantimento, por outro faltava dinheiro para gêneros fabris ou manufaturados. 

Só alguns tropeiros podiam gabar-se de tostões magros nas algibeiras fundas. 

O Tenente Urias e sua caravana eram promessa de renovação em terras da “Fazenda Velha”. 


O PRIMEIRO ACAMPAMENTO 

Eram terras devolutas aquelas além das divisas da “Fazenda Velha”. 

O Governo Imperial autorizou o uso das terras e, vencida a burocracia, lá instalaram o primeiro acampamento à margem do córrego divisor, onde mais tarde o Tenente Urias viria assentar o moinho para beneficiar o trigo plantado aqui pela primeira vez. 

O primeiro passo do picadão devia alcançar a Serra de Fartura, num plano de dois anos de trabalho. 

A mando do Tenente Urias, um grupo de escravos foi designado para reconhecimento e demarcação territorial. 

Caminharam mato a dentro fixando acampamento duas léguas e pouco mais adiante. 

A primeira etapa do picadão era essa e demorou dois anos de trabalho a conjugar o braço negro e o braço branco. 

Um fato curioso daquela época viria marcar o presente: o preto Justino Clecêncio da Costa contraiu uma doença, não pode continuar no trabalho e construiu um rancho nas cabeceiras do Ribeirão Guarupu. 

Esse rancho foi o marco do atual Bairro da Justinada, pois foi iniciado pelo preto Justino e seus descendentes. 

PERSPECTIVAS 

O preto Justino e seus familiares formaram o núcleo da “Justinada”, mais tarde o Bairro da Justinada. 

O Tenente Urias e seus homens varavam o rumo a facão buscando a Serra da Fartura. 

Cada perobeira que caía esmagando os arbustos rasteiros cantava perspectivas. Mas o sangue mineiro espadanando o cérebro do Tenente não incentivava uma visão de campos agrícolas ou pastagens. Estava em seu entusiasmo o amarelo âmbar do ouro que afloraria das entranhas virgens da terra nova ou o fosco argênteo da prata bruta. 

Cada córrego, cada espigão gritava riquezas minerais abundantes. E os lugares do lajeado cantavam à civilização que chegava a lenda bonita da Serra da Prata, bem além do espigão divisor das águas. 

Diziam de um morro cuja capa de terra não ultrapassava 50 centímetros. O mais tudo era prata, laje compacta de prata pura do melhor teor. 

No espírito de aventura do velho Tenente acendia o desejo do sertanista: levar a bateia e a bússola e trazer os alforjes cheios de ouro, prata e pedras preciosas. 

Foi por essa época que surgiu a ideia de requerer, perante o Império, parte das terras devolutas da Paranapiacaba. 

Era o ano de 1.873. 

Iniciava-se a construção da casa branca, sede do acampamento do empreiteiro do Império, às margens do Ribeirão divisor das terras da “Fazenda Velha”. 


PASSOS PARA O FUTURO 

Enquanto o picadão avançava mata a dentro, atravessando a terra virgem em busca da Serra da Fartura, o Tenente Urias se ocupava das pesquisas dos córregos e dos rios. 

Isso era necessário para levantamento topográfico e tornava-se interessante como uma promessa de ouro ou de prata. E no sangue do mineiro estava patente a chama de bandeirante inato, aquela labareda imorredoura que faz o desbravador. 

No acampamento, o interesse despertado pela nova terra operava milagres. 

Um pouco mais para leste do Lajeado, surgia o trigal dourando uma clareira a pintalgar o verde das capoeiras exuberantes. 

E às margens da seara surgiu o moinho, dando trabalho a brancos e negros, originando o Bairro do Moinho, próximo ao Bairro Lajeado. 

A esperança criava o porvir. 

Os homens transformavam a natureza agreste em campo de trabalho e produtividade. O progresso chegava sem alarde, mas preciso e certo. E o Tenente Urias talvez nem cismasse com a grandeza dos seus passos para o futuro. 

Seus olhos estavam fitos nas minas que surgiriam... 

E essa mina de amor e fraternidade, hoje, chama-se São Miguel Arcanjo. 


PASSOS DE GIGANTE 


A Serra ao longe era o convite. 

Para os escravos, a meta do trabalho proposto. Para o Tenente Urias, um passo em busca da lendária mina de prata e, quiçá, veios de ouro aflorando das rochas, velhas estórias dos índios que habitavam junto ao córrego onde o Tenente erguera o primeiro moinho das redondezas. 

Na esperança dos homens estava um sonho de gigante andando a passos largos em rota de futuro. 

O picadão serpenteava o contorno das encostas varando os ermos da Fartura em busca da Colônia de Santo Antonio de Juquiá, donde seguiria ao encontro da estrada dos portos de Iguape e Cananéia. 

Longe estava o final da epopeia. 

Brancos e negros suavam por igual num trabalho de cooperação miscigenada. Na frente do grupo, entrando impoluto à mataria, facão na cinta, chapéu amplo na cabeça, o Tenente Urias buscava o ouro e a prata ao mesmo tempo que recebia as parcelas dos dez contos de réis do Governo Imperial. 

A tropa morosa carregava os víveres. 

A primeira etapa era o pouso do Justino. Depois, de semana em semana, o picadão mais longe ampliava as clareiras de acampamentos mudados. 

Era a realização da empreitada. 

Na “Fazenda Velha”, o progresso chegava com imigrantes de outras bandeiras. Era o chamamento ao convívio de homens que trabalhavam. 

O comércio engatinhou em terras da “Fazenda Velha”, repartindo com Lajeado, lá onde o Tenente Urias construiu a sua casa branca. 


SEARAS NASCITURAS 


Longe estavam os tempos de Aiuruoca, Baependi e Casa Branca. 

Se uma saudade agri-doce vinha de per si bater às portas do coração, as famílias mineiras espantavam a nostalgia com um cântico de esperança. 

O picadão da estrada avançava desbravando e descobrindo. 

O Tenente Urias buscava a lendária Serra de Prata. 

Sua gente em terra nova cuidava das searas nascituras. O trigo dourado balançava em revérberos as espigas cheias que enunciavam farta colheita e trabalho ao moinho novo. 

Outras gentes chegavam de plagas longes com esperanças gigantes aportando no Lajeado ao derredor da casa branca. 

“Fazenda Velha” também sentia o impulso do progresso, menino a engatinhar pelas searas nascituras. 

Lajeado ganhava aspecto de vilarejo civilizado que aos domingos desfilava fatiotas de casacas longas e gravatas de seda fina. 

Surgiu a ideia da banda de música. 

Sempre o cântico representou o desabafo da saudade humana e a saudade é forte quando lá longe está o ente amado. 

E para diminuir a saudade, o Tenente Urias imaginou convidar aos parentes que ainda estavam em Minas Gerais a morarem nestas bandas. 

Para tanto, o seu primeiro passo foi negociar com o Nogueirinha as terras da “Fazenda Velha”. 


UMA SOCIEDADE NOVA 

As negociações das terras da “Fazenda Velha”, como todo negócio que se preze, foram morosas por desencontro de preços. Entretanto, enquanto o Coronel Nogueirinha e o Tenente Urias não decidiam, as estradas iam percebendo maior movimento. 

Das Vilas de Nossa Senhora dos Prazeres de Itapetininga e do Bom Jesus de Capão Bonito, aportavam tropas na “Fazenda Velha” e na casa branca do Lajeado. 

Com os tropeiros chegavam histórias de outros centros, cores de progresso e civilização. E o povo ansiava por essa luz que alumiava as adjacências, buscando reflexo à vida dominante da nova sociedade. 

Do moinho novo a farinha levava o nome dos pioneiros. 

Havia interesse ao derredor. 

Era preciso oferecer aos visitantes algo compatível com os costumes dos centros modernos, mesmo ante a tristeza de abandonar as tradições sertanistas. 

Uma nova sociedade surgiu por imperativo da evolução natural. 

De colonizadores, os mineiros se transformaram em posseiros ricos e exigentes dos requintes sociais tão naturais da burguesia que projetava no cenário pátrio em busca de objetivos mais amplos em favor da projeção social. 

Como traduzir o anseio de progresso aos olhos de todos quantos viessem para cá, senão apresentando algo digno de demonstrar a elevação da Colônia? 

Antes de buscar a emancipação política (já que se notava a emancipação econômica), era preciso vestir a região com fatiotas da sociedade padrão. 

Veio a ideia de fundar a primeira banda de música para o Lajeado. 

CAUSAS E EFEITOS 

O pessoal vibrava. 

Só no falar da banda de música já considerava em retreta importante em cima de mais importante coreto. 

A mente é ativa. 

Pintora exímia, ela coloria os devaneios dos mineiros. 

Tudo, tudo retratava o anseio do povo em busca de melhores dias. 

O Lajeado era palco de projeto importante. 

Todo homem e toda mulher tinha o direito de sugestionar o título da corporação, a cor do uniforme, a escolha do repertório. 

As crianças, por um imperativo da época, não participavam da conversa dos mais velhos. No entanto, ficavam lá no terreiro, improvisando zabumbas e soprando num canudo de taquara do reino a melodia mais em voga. 

A epidemia alastrou. O amor pela arte, o dom natural da geração altiva e operosa manifestou-se em geral. 

Ao mesmo tempo quiseram disputar a primazia da primeira banda de música com o Lajeado, a “Fazenda Velha” e a Capuava. 

Se havia a força econômica na casa branca, nos demais núcleos correram listas e fizeram-se leilões. 

A finalidade era arrecadar fundos para a compra dos instrumentos. 

Ninguém queria perder tempo nem ser passado para trás. 

Esse interesse e essa altivez de cada núcleo foram os grandes responsáveis pela nossa emancipação política e econômica. 

Nossa história de colonização foi curta. 

Tão logo conseguiram a primeira corporação musical, pensaram logo em transformar o Lajeado numa cidade grande. 


IMPULSOS PARALELOS 

O Lajeado era conhecido por ita-uçu, toponímia que não permaneceu depois do desaparecimento da pequena tribo que talvez fugisse para os sertões de Cananéia, tão logo em contato com a civilização. 

Esse foi um dos motivos que levaram o Coronel Nogueirinha, primeiro dono destas terras, a chamar a região de “Pedrão do Turvo”. 

Lajeado é batismo das famílias mineiras. 

Na ânsia de transformar o Lajeado em vilarejo importante, surgiu a ideia da banda de música. Essa idéia tomou forma e agigantou-se. Contrataram o maestro Gumercindo da Silva Prado e partiram para a aquisição de instrumentais. 

Dezesseis figuras, num amplexo de miscigenação, formavam o corpo altivo da primeira escola de solfejos do Lajeado. 

Brancos e negros esperavam a igualdade dos uniformes que deveriam ser de brim cáqui com botões e liras douradas, galões faiscantes e pendentes vivos descendo de platinas trabalhadas. 

Capuava Grande não ficou atrás. Sob a regência do mestre Teodato (professor Teodato de Arruda Mello), fundou sua banda com farda azul marinho sem menos em dourações e enfeites. 

Dó, ré mi, fá, sol, lá, si, dó... Impulsos paralelos. 

Lajeado e Capuava arrancavam para o progresso tão carente às margens do Paranapiacaba. 

Depois de muito esforço, surgiram a “Alvorada do Lajeado” e a “Lira Capuavense”, duas corporações que trocavam orgulhosas gentilezas à fronde das amoreiras e jabuticabeiras, dando ao Lajeado e ao Capuava um ar de festa importante. 

A “Fazenda Velha” não quis ficar por menos. Liderado pelos Terra, gente mineira tão igual à do Lajeado e Capuava, o povo da “Fazenda Velha” iniciou a sua campanha. 

Todos os núcleos da Paranapiacaba marchavam paralelamente em busca do melhor. Desse impulso forte de gente progressista, deveria acontecer a grandeza de uma cidade, mas era, até então, impossível precisar que se destacaria. 

OS PASSOS DA “FAZENDA VELHA” 

O “moço” Miguel dos Santos Terra morava na “Fazenda Velha”. Era genro do Tenente Urias. Com facilidade extraordinária, arrebanhou uma comissão a fim de dar à “Fazenda Velha” uma banda de música tão igual ou melhor que as do Lajeado e Moinho. 

Essa comissão destaca nomes importantes da nossa história, tais como: João Alfredo Leme Brizola, Miguel Ferraz de Campos, João de Souza Nogueira, João Alves Freitas, Urias de Souza Nogueira, Manoel Augusto Trindade e outros. 

Miguel dos Santos Terra conseguiu auxílio da “Lira” de Nossa Senhora dos Prazeres de Itapetininga, recebendo duas vezes por semana o maestro João Lírio Colaço, que vinha de charrete pela estrada poeirenta, trazendo numa pasta de couro cru, os solfejos complicados. 

Os preparativos empolgavam. 

Repetia-se na “Fazenda Velha” o que já havia acontecido ao Lajeado, Moinho e Capuava. 

O povo só falava na banda, nos solfejos, no pentagrama, nas figuras e nos compassos. 

Fora, sem dúvida, essa etapa da história, o marco de integração do ideal popular, orientando os interesses pela causa da emancipação. 

Chegou o domingo esperado. 

Sob regência do maestro Colaço, ao lado do mangueirão, sob a figueira grande que ensombrava o pátio da “Fazenda Velha”, duas bandas se dividiram na retreta. 

Era a de Itapetininga e a da ”Fazenda Velha”. As duas se denominavam Lira, mas a segunda perdeu a denominação e passou a ser conhecida apenas como “Banda dos Terra”, por muito tempo. 

Anos depois, os músicos remanescentes dessas três corporações viriam a formar a “Lira Sãomiguelense”, mas isto é para uma outra história. 

LUTO COBRE A “FAZENDA VELHA” 


Preocupado com a mineração e com a abertura da estrada, o velho Tenente Urias não cuidou que a “Fazenda Velha”, onde viviam filhos e genros seus, e dentre eles, Miguel dos Santos Terra, alcançava maior progresso devido a vinda de muitos forasteiros que tentavam a sorte na região. Já haviam radicado na “Fazenda Velha” muitos sírio-libaneses responsáveis pelo comércio que engatinhava de mala em mala ou numa botica modesta. 

Alguns italianos sitiavam o redor desbravando as matas e cultivando a terra. 

Muita gente vizinha vendeu suas terras de outras bandas e correram a fazer posse para cá, talvez movidos pela decantada lenda da “Serra de Prata”, da qual os bugres diziam, e pela qual o Tenente Urias passava anos pelos sertões de Paranapiacaba. 

Dentre estes que aqui estavam, muitos nomes destacaram na história da nossa emancipação, mantendo alto relevo, além dos filhos de Minas Gerais, os Fogaça de Almeida e os Brizola. 

A “Fazenda Velha” já possuía um aspecto de Vila. Seus habitantes, preocupados com os destinos dos filhos, reclamavam uma escola. Os jovens programavam um clube no estilo das agremiações políticas que se formavam por todo Brasil, pregando ideais abolicionistas e republicanos. 

A conjuntura político-social do final do século incentivara o anseio do homem e, na “Fazenda Velha”, viviam homens de tradição liberal. 

O Império agonizava ante a força do ideal republicano que vibrava pela modificação das estruturas políticas. 

A sede da “Lira” da “Fazenda Velha” reuniu muitos jovens em saraus cívicos onde se cogitava participar ativamente como Grêmio republicano e como força da emancipação da “Fazenda Velha”. 

Mas... Descabido mas... Um acontecimento triste veio turvar os acontecimentos. O luto cobriu a “Fazenda Velha”, a casa branca, o Lajeado e o Moinho... 
Morrera o Tenente Urias! Findava o ano de 1.881. 
Abaixo, lembrança do santinho da missa de sétimo dia de Roque Mariano Ribeiro.

DOMINGOS NOGUEIRA DE MEDEIROS, O "SEU TICO"



QUEM FOI TICO MEDEIROS? 


Corria o ano de 1.908. 

Ainda não havia sido criado o Biotônico Fontoura. 

Bem num dia 02 de novembro, quando todos relembravam com tristeza os seus mortos, é que Domingos Nogueira de Medeiros decidiu chegar a este mundo. 

Com seu choro forte, alegrou todo aquele ambiente ruim, fazendo sorrir a Francisca Augusta Nogueira Galvão e José Vitorino de Medeiros, casal de gente muito pacífica que transmitiu ao filho querido a mesma calma, a terna paciência, a seriedade e a educação que sempre foram os maiores predicados da família. Aliás, predicados esses derivados da genética da família, pois a mãe era bisneta do Tenente Urias Emigdio Nogueira de Barros, lá de Baependi, Minas Gerais. 

Pequeno e franzino, o menino foi apelidado carinhosamente de Tico. Mas nunca foi uma criança doente. 

QUE TROCOU O CARGO POR UM CAVALO 


Aos 20 anos começou a trabalhar de servente na “Escolas Reunidas”, situada na Rua Siqueira Campos em frente ao casarão do Nhô Bento França, ao lado do campo de futebol que hoje abriga o antigo barracão da Prefeitura. 

Lá permaneceu por alguns anos, desistindo do cargo em troca de um cavalo. 

Quem era o dono do cavalo? 

Luiz Cezar de Noronha, que esteve até o fim da vida trabalhando como funcionário escolar. 



LEITOR 


Nosso biografado lia muito e possuía diversos livros. No ano de 1.931, no jornal “O Progresso”, lá se via notícia da doação de alguns dos seus livros para a Biblioteca Infantil da cidade. Eram: “Ciências Físicas e Naturais”, de V. Martel; “Meu Samburá”, de Cornélio Pires e “Céus, Terra e Mar”, de Alberto de Oliveira. 


A REVOLUÇÃO 


Durante a Revolução Constitucionalista de 1.932, Domingos foi defender São Paulo contra os gaúchos de Getúlio Vargas. Nas trincheiras próximas ao Rio das Almas, acabou sendo ferido à bala. Graças a Deus que o estilhaço lhe entrou e saiu pelo braço, sem maiores consequências. Bastaram alguns dias de curativo e paciência. 

Foi aí que lhe veio a maior inspiração da sua vida. E que até já tentaram lhe roubar o mérito. Era sobre o anjo São Miguel que fez com que a guerra terminasse do jeito que terminou, sem nenhum derramamento de sangue em São Miguel Arcanjo. 

Tão logo terminada a Guerra, casou-se com Maria Augusta Sotho e foram residir no Bairro do Alegre, hoje pertencente a Pilar do Sul. Porém a vida no mato não era para ele. 

Voltou à cidade. 

Não podendo ficar sem trabalhar, foi falar com o deputado Gualberto Moreira. Este lhe ofereceu de novo o serviço de Servente, só que em uma escola de Sorocaba. Sete anos depois, fez troca com João Gatto e voltou para São Miguel, trabalhando na Escola Estadual “José Gomide de Castro”, ao lado dos colegas Luiz Cezar de Noronha e Elza Loureiro de Camargo, nora do Major Luiz Válio. 

Na Escola, atuava como verdadeiro quebra galho, pois entendia de tudo, desde varrer o pátio, consertar uma bola, apontar lápis, reparar velhos encanamentos e refazer instalações elétricas. 

Mas deixou seu nome ligado, principalmente a duas coisas: a um sino e à forma com que apontava lápis quando se solicitava sua ajuda. 

O sino, tocado com seu coração, avisava aos estudantes sobre a hora de arrumar a fila para entrar na classe ou sair para o recreio, de silenciar ou de dispersar, de dizer adeus e ir para casa. 

Apontar lápis? Era com maestria que ele fazia! 

Domingos foi Presidente da Congregação Mariana por duas vezes. Durante cinco anos tomou parte da Diretoria da Corporação Musical Sãomiguelense. 

Foi Domingos Medeiros quem fez pela primeira vez a festa de Santo Antonio em São Miguel Arcanjo no terreiro do mercado velho, no imóvel onde se estabeleceu a primeira Creche da cidade. 

Braz Alves Munhoz continuou por algum tempo fazendo a festa em seu lugar, após a sua morte. 

Dos filhos, o único que aqui permaneceu foi Eney, o popular Ney da Banca Central, casado com Maria (artesã e artista plástica) e que são os pais da Regina e do Renato. 

Os outros: Elizabete, Edgar, Antonio, Maria Aparecida, Renê Augusta e Sônia Maria são cidadãos sorocabanos e itapetininganos. A filha Norma Tereza faleceu ainda criança. 

Quando “Seu Tico” deixou esta vida, aos 17 de novembro de 1.971, a Banda Lira da cidade acompanhou seu féretro. 

A Lei Municipal número 948, de 22 de abril de 1.980, isentou de IPTU a todos os ex- combatentes da Revolução Constitucionalista de 1.932 que fossem possuidores de imóvel construído localizado na zona urbana do município utilizado para sua própria residência. 

Mas ele já não estava mais necessitando desse benefício. 

Ao contrário de Roque Mariano Ribeiro, que possui um logradouro com seu nome, no Jardim Nova Bela Vista, Domingos Nogueira de Medeiros ainda não foi homenageado. 

O “CAUSO” QUE O TICO INVENTOU 


O “causo” que o Tico Medeiros inventou era endossado completamente pelo João Cornélio, um ativo participante e defensor dos paulistas na Revolução Constitucionalista de 9 de julho de 1.932. 

João Cornélio fora encarregado da Limpeza Pública ao tempo de Nestor Fogaça e teve José Orlando Nunes como um dos seus auxiliares mais competentes. 

Roque Mariano Ribeiro fez publicar a estória no seu jornal “Folha de São Miguel Arcanjo”. Assim: - “Nos últimos dias da referida revolução, os gaúchos, vitoriosos, já viajando de volta para a capital paulista depois da tomada do Rio das Almas, no município de Capão Bonito, aproximaram-se de São Miguel Arcanjo. 

Foi então que um milagre aconteceu. 

Sem tempo para uma total evacuação da cidade, populares ficaram à mercê dos vencedores que tinham, como todo inimigo, a fama de péssimas personalidades. 

A Companhia gaúcha, ao atingir a colina onde se situavam as fazendas do Major Luiz Válio fez menção de acionar os canhões sobre a cidade, não respeitando o fim da guerra. 

Então, surgiu um soldado de trajes e guarnições douradas e de porte magnífico que, pondo-se a sua frente, apenas com um gesto da espada, acabou impedindo suas demoníacas intenções. 

A arma do estranho soldado faiscava ameaçadora, estarrecendo os soldados que, paralisados pela visão magnífica, não puderam mover um só dedo contra o lugarejo. 

Nesse momento, ameaçou chuva. 

Ventos terríveis tornavam impossível divisar as saídas da Vila. 

Os gaúchos, cuidadosamente, foram seguindo em direção ao centro em busca de um lugar para se protegerem. 

Na falta de outro alojamento, procuraram pela frágil capelinha do lugar. 

Uma vez sentados ao chão, constataram, estupefatos, que o soldado que os afrontara de espada em punho estava ali à frente deles, com a espada em riste. 

Era o mesmo protetor da Vila, o Arcanjo São Miguel. 

Também no jornal o amigo Roque Mariano Ribeiro deixou uma última e sentida homenagem a Tico Medeiros na edição de 27 de novembro de 1.971: 

“Vida... Morte! 

Deus sabe o que faz, mas a saudade não sabe. 

Tico Medeiros, nosso velho amigo Domingos dos Santos Medeiros passou por nós. 

Veio, conviveu, fez amizade, sorriu, sofreu... E passou. 

No dia 17 ele passou desta vida para a eternidade. 

Não morreu. 

Sua memória ficará conosco, será saudade nesta geração. 

Quem não foi aluno sob seus cuidados no Grupo Escolar “José Gomide de Castro”? 

Quem não se lembra das vezes que ele apontou os nossos lápis, porque éramos pequenos demais para o fazer? 

Quem não o teve por guarda nos folguedos infantis do recreio? 

Quem não recebeu de sua mão uma classe limpa? 

Tico Medeiros viveu conosco todos os dias de nossa escola. E, quando adultos voltamos ao velho Grupo para lecionar onde outrora fomos alunos, lá estava ele, solícito e aguardando pacientemente sua aposentadoria. 

Deus o aposentou com uma pensão vitalícia espiritual lá no Céu... Levou-o varrer classes aos anjinhos que ainda vão à escola de Santidade sob o olhar bondoso do Mestre dos Mestres. 

Choramos. Rezamos. 

Não há confortar a tristeza que dá a falta de um grande amigo. Este jornal perdeu o entusiasta colaborador da coluna “São Miguel Arcanjo, Uma Realidade, Uma esperança”. Os mentores perderam um grande amigo. Por isso fazemos esta homenagem singela. 

Queremos gravar nestas páginas modestas aquele que desde muito antes da ideia deste jornal já colaborava com ele. Quando o velho Tico, o Nhô Tico dos mais velhos, assistia-nos na escola, ele já estava colaborando com este jornal que viríamos escrever. 

Portanto, lá donde está, velho amigo, sinta que nós o estimamos. 

Um dia teremos de estar lá e diremos: 

- “Velho Tico, mas como você deixou saudade"!