Como bem lembra o João Diniz, com o tempo, até as aves se cansam de viver no mesmo lugar e partem em busca de outros ambientes um pouco mais alegres e coloridos.
Prova disso, os ‘sem-fim’.
São Miguel Arcanjo, algum tempo atrás, fora morada de uns passarinhos conhecidos por ‘sem-fim’.
Geralmente de cor pardo-amarelada, eles apresentavam manchas escuras nas asas e um topete avermelhado. A garganta e o abdome eram brancos, as sobrancelhas da mesma cor e costumavam colocar seus ovos em ninhos de joão-teneném.
Algumas pessoas chamavam esses passarinhos de piririguás, outras de fenféns, tempos-quentes...Todavia, ficaram bastante conhecidos como ‘sem-fim’, pois o seu canto era parecido com essa expressão.
Embora muita gente ouvisse nitidamente eles gritarem ‘sem-fim’, outras juravam que não era nada disso e, sim, ‘sa-ci’ o que eles diziam.
Sem-fim ou saci, qualquer que fosse o canto dessas aves, o certo é que já não se ouve mais por aqui.
Conta o João Diniz que eles faziam a festa mesmo era no taquaral do Francisco Cavacini.
- ‘Era tão bonito de ouvir!’ – suspira o João Diniz a cada vez que se lembra deles.
Casadinho de novo, João morava longe, lá na saída para Pilar do Sul onde hoje reside a família Mendez que lhe paga aluguel.
Trabalhando como ajudante na serraria do Wadi Hakim, muitas vezes voltava tarde para casa.
Até que uma noite...
Era uma sexta-feira. Mês de agosto. Teve festa na Vila e ele, como bom vicentino que era, pôs-se a auxiliar o pessoal da quermesse e depois na limpeza geral. Quando resolveu ir embora, era mais de onze e meia da noite.
Acompanhado do Nicanor Monteiro, apelidado de Beronha, um cabra medroso pra mais de metro, lá foram os dois, pisando depressa pela estrada de terra.
-‘ Ainda bem que não choveu!’ – asseverou o João.
De repente, um barulho no mato. Passos. Corrida.
O que?
Pelo rabo dos olhos eles puderam ver:
-‘Credo, Beronha, os cavalos do Cavacini pastando de noite?’.
Noutro repente, uns assobios.
- ‘Devem ser dos passarinhos, dos ‘sem-fim’, ou dos ‘sacis’.
Mais assobios. E ali pertinho.
Não, não eram de passarinhos. Pareciam assobios de verdade. O Beronha a ponto de desmaiar.
O João? Nem sabia por onde andavam as calças, muito menos as pernas. Eta, macho!
Nesse instante foi que os cavalos desembestaram. E os dois homens também. Não antes de verem, montado em cima de um deles, um vulto preto, pequeno, lascando fogo de um enorme cachimbão preso na boca.
O Beronha só olhou para o João Diniz...este acabou encontrando as próprias pernas e ambos debandaram a correr mais do que os cavalos do Cavacini.
Depois dessa noite, a mulher do João passou a ver o marido em casa antes da lua aparecer no céu.
Sempre achou que era por amor.
Nenhum comentário:
Postar um comentário