sábado, 21 de dezembro de 2013

"MINHA TERRA NO PASSADO"


Com saudades me lembro:
minha terra abençoada
era tão maravilhosa
como um reino de fadas.
Esta região querida
que me traz lembranças mil,
o reino da minha infância
e onde sempre vivi...
Na tranquilidade dos tempos,
quando tudo aqui sorria,
esta terra hospitaleira
era cheia de poesia.
E como era agradável
o ar puro das campinas
e dessedentar nos regatos
de águas puras, cristalinas,
e sentir das matas virgens
o cheiro agreste e sadio,
ouvindo tranqüilamente
o marulhinho dos rios...
E gravado em minha mente
o arrulhar da juriti,
a araponga estridente,
e o indiscreto bem te vi.
Passarinhos aos milhares
embelezando a floresta;
e correndo atrás dos vales
a fonte sempre em seresta,
a enorme queda d’água
caindo da ribanceira
e a água espumejando
nas pedras da cachoeira.
Nos ribeiros transparentes,
tartarugas e os peixinhos,
e nas correntes mais rasas
as inúmeras pedrinhas
brancas, pretas e esverdeadas,
cinzentas e amarelinhas...
A malacacheta doirada
e, entreabertas, as conchinhas.
As pitangas, as uvaias
e as gabirobas do campo
e amarelando os frutos
do araçazeiro, e que tanto!
Ingá, jataí, jabuticaba
e lindas cerejas silvestres,
amoras cor de esmeralda
e melanciinha campestre.
Baguaçu e palmitinho
e as castanhas já douradas...
Fartura por toda a parte,
tudo puro, sem custar nada.
Fabulosa a sertania!
Quanto tesouro ali guardado!
Onde qualquer um podia
desfrutá-lo...No passado!
Do palmeiral,o palmito
e toda a vegetação
e a caça que deu sustento
a muitos nesta região.
É pena que a ambição
e a ganância de hoje em dia
destruiu a natureza
e a riqueza que aqui havia.
Os arroios, os capoeirões,
peixes e aves de toda espécie,
pululava a caça miúda
e o mel de abelhinhas agrestes!
A operosa ‘mandassaia’
do mel claro, fino e limpinho.
E que importante o trabalho!
Cada favo em um potinho...
A anduri, a arapuá,
eram seus nomes assim,
a jandaia e entre outras
também a tuiu mirim.
E para as enfermidades,
as plantas medicinais
germinando em cada canto
nos campos, nos matagais;
o inhame para o sangue;
para tosse, o caraguatá,
cipó sumo, beririço;
e pro estômago, o pacova.
Hoje sempre eu me pergunto:
as coisas que aqui eu conheci
de belo e de importante
por que não anotei, não escrevi??
Como aquele jato d’água
fazendo o monjolo cantar
e também movido a água
o moinho a trabalhar;
enormes engenhos de cana
que davam tanta fartura,
açúcar de tacho e de forma,
o melado e a rapadura,
o gado grosso e miúdo...
Quanto alimento de graça:
leite, queijo, requeijão,
a manteiga e a coalhada.
Os córregos cheios de vida,
pequenos lagos tranquilos
onde à beira dos barrancos
as patas faziam seus ninhos.
No açude, dava até medo
dos feiosos jacarés.
E os enfeites das lagoas
lindas garças e paturés...
Elevando-se aqueles festões
nas florestas e nos cerrados,
a taquara que se utilizava
no trabalho do artesanato.
Balaios grandes e cestas
os covos e os jacás,
os cestinhos de costura,
peneira, sururuca e os apás,
lindos balainhos com tampa
a cores vivas e com listras.
A pessoa que os fabricava
era cem por cento artista.
E a seu tempo, nas planuras,
nos outeiros pouco elevados
a seara branquejando.
Era algodão por todo lado.
E nas quietas cercanias,
entre o verde matizado
até os arrozais se estendiam,
beirando o rio e banhados.
Minhas queridas campinas,
meus lindos bosques floridos,
em harmonia divina
o orvalho recém caído.
Quem dera ver a colina
banhada pelo luar;
também ouvir em surdina
o riachinho a cantar.
Ver os lindos beija flores
adejando pelos prados
e o sabiá entre as frondes
a soltar lindos trinados.
Ver o imenso descampado
nos arbustos tão brilhantes,
os besourinhos dourados
e as borboletas reinantes,
as açucenas vistosas
entre as florinhas do campo
e as guirlandas mimosas
entrelaçando os barrancos.
O esplendor da alvorada
em um dilúvio de cores
A festa da passarada...
Manhãs de canto e de flores,
a lua aclarando a serra
e a florada no sertão.
As belezas desta terra,
as riquezas deste rincão,
não mais florestas e vales,
encanto dos sonhos meus.
Beleza dos meus cantares,
rios e montes, adeus!

Maria Arantes Galvão Guimarães.

A autora nasceu em São Miguel Arcanjo no ano de 1915. 
Era filha de Leontino Arantes Galvão e Amélia Fogaça de Almeida Arantes Galvão e teve três filhos frutos do seu casamento com José Lima Guimarães: Lígia Maria, que se casou com Edward Rosa do Nascimento; José Antonio, que se casou com Maria da Graça Oliveira; e Antonio Carlos, que se casou com Inês Parente.

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