Com
saudades me lembro:
minha
terra abençoada
era
tão maravilhosa
como
um reino de fadas.
Esta
região querida
que
me traz lembranças mil,
o
reino da minha infância
e
onde sempre vivi...
Na
tranquilidade dos tempos,
quando
tudo aqui sorria,
esta
terra hospitaleira
era
cheia de poesia.
E
como era agradável
o
ar puro das campinas
e
dessedentar nos regatos
de
águas puras, cristalinas,
e
sentir das matas virgens
o
cheiro agreste e sadio,
ouvindo
tranqüilamente
o
marulhinho dos rios...
E
gravado em minha mente
o
arrulhar da juriti,
a
araponga estridente,
e
o indiscreto bem te vi.
Passarinhos
aos milhares
embelezando
a floresta;
e
correndo atrás dos vales
a
fonte sempre em seresta,
a
enorme queda d’água
caindo
da ribanceira
e
a água espumejando
nas
pedras da cachoeira.
Nos
ribeiros transparentes,
tartarugas
e os peixinhos,
e
nas correntes mais rasas
as
inúmeras pedrinhas
brancas,
pretas e esverdeadas,
cinzentas
e amarelinhas...
A
malacacheta doirada
e,
entreabertas, as conchinhas.
As
pitangas, as uvaias
e
as gabirobas do campo
e
amarelando os frutos
do
araçazeiro, e que tanto!
Ingá,
jataí, jabuticaba
e
lindas cerejas silvestres,
amoras
cor de esmeralda
e
melanciinha campestre.
Baguaçu
e palmitinho
e
as castanhas já douradas...
Fartura
por toda a parte,
tudo
puro, sem custar nada.
Fabulosa
a sertania!
Quanto
tesouro ali guardado!
Onde
qualquer um podia
desfrutá-lo...No
passado!
Do
palmeiral,o palmito
e
toda a vegetação
e
a caça que deu sustento
a
muitos nesta região.
É
pena que a ambição
e
a ganância de hoje em dia
destruiu
a natureza
e
a riqueza que aqui havia.
Os
arroios, os capoeirões,
peixes
e aves de toda espécie,
pululava
a caça miúda
e
o mel de abelhinhas agrestes!
A
operosa ‘mandassaia’
do
mel claro, fino e limpinho.
E
que importante o trabalho!
Cada
favo em um potinho...
A
anduri, a arapuá,
eram
seus nomes assim,
a
jandaia e entre outras
também
a tuiu mirim.
E
para as enfermidades,
as
plantas medicinais
germinando
em cada canto
nos
campos, nos matagais;
o
inhame para o sangue;
para
tosse, o caraguatá,
cipó
sumo, beririço;
e
pro estômago, o pacova.
Hoje
sempre eu me pergunto:
as
coisas que aqui eu conheci
de
belo e de importante
por
que não anotei, não escrevi??
Como
aquele jato d’água
fazendo
o monjolo cantar
e
também movido a água
o
moinho a trabalhar;
enormes
engenhos de cana
que
davam tanta fartura,
açúcar
de tacho e de forma,
o
melado e a rapadura,
o
gado grosso e miúdo...
Quanto
alimento de graça:
leite,
queijo, requeijão,
a
manteiga e a coalhada.
Os
córregos cheios de vida,
pequenos
lagos tranquilos
onde
à beira dos barrancos
as
patas faziam seus ninhos.
No
açude, dava até medo
dos
feiosos jacarés.
E
os enfeites das lagoas
lindas
garças e paturés...
Elevando-se
aqueles festões
nas
florestas e nos cerrados,
a
taquara que se utilizava
no
trabalho do artesanato.
Balaios
grandes e cestas
os
covos e os jacás,
os
cestinhos de costura,
peneira,
sururuca e os apás,
lindos
balainhos com tampa
a
cores vivas e com listras.
A
pessoa que os fabricava
era
cem por cento artista.
E
a seu tempo, nas planuras,
nos
outeiros pouco elevados
a
seara branquejando.
Era
algodão por todo lado.
E
nas quietas cercanias,
entre
o verde matizado
até
os arrozais se estendiam,
beirando
o rio e banhados.
Minhas
queridas campinas,
meus
lindos bosques floridos,
em
harmonia divina
o
orvalho recém caído.
Quem
dera ver a colina
banhada
pelo luar;
também
ouvir em surdina
o
riachinho a cantar.
Ver
os lindos beija flores
adejando
pelos prados
e
o sabiá entre as frondes
a
soltar lindos trinados.
Ver
o imenso descampado
nos
arbustos tão brilhantes,
os
besourinhos dourados
e
as borboletas reinantes,
as
açucenas vistosas
entre
as florinhas do campo
e
as guirlandas mimosas
entrelaçando
os barrancos.
O
esplendor da alvorada
em
um dilúvio de cores
A
festa da passarada...
Manhãs
de canto e de flores,
a
lua aclarando a serra
e
a florada no sertão.
As
belezas desta terra,
as
riquezas deste rincão,
não
mais florestas e vales,
encanto
dos sonhos meus.
Beleza
dos meus cantares,
rios
e montes, adeus!
Maria Arantes Galvão Guimarães.
A autora nasceu em São Miguel Arcanjo no ano de 1915.
Era filha de Leontino Arantes Galvão e Amélia Fogaça de Almeida Arantes Galvão e teve três filhos frutos do seu casamento com José Lima Guimarães: Lígia Maria, que se casou com Edward Rosa do Nascimento; José Antonio, que se casou com Maria da Graça Oliveira; e Antonio Carlos, que se casou com Inês Parente.
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